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  Pierre Bourdieu

 
   

sociologue énervant

 
   

 

Décès de Pierre Bourdieu :(
 

 
   

 


Pierre Bourdieu

 PIERRE BOURDIEU (1930-2002)
 Tributo a um crítico radical.




Alberto Dines, Observatorio da Imprensa (BR), 30/01/2002.

 


 

s diários mais do que os semanários – e isso é sintomático – souberam resenhar a vida e a obra do sociólogo francês falecido na quarta-feira (24/1/02). Para a nossa TV, por enquanto, ele não viveu nem morreu, porque para a nossa TV Bourdieu não existe nem importa.

Das 20 obras que escreveu, a mais intensamente divulgada e debatida foi um livrinho com apenas 95 páginas em formato pequeno, "Sur la Télévision". A edição original (Liber, dezembro de 1996) foi imediatamente acompanhada por uma edição brasileira (Jorge Zahar Editor, agosto de 1997), numa agilidade editorial inédita, considerando a especificidade do assunto (143 páginas em formato de bolso).

Extraordinário best-seller (o exemplar aqui examinado é da 10ª edição, impresso em maio de 1997, seis meses depois de lançado). Pivô de um dos mais importantes debates travados na mídia francesa porque tratava da mídia. E a tratava com todo o rigor. Mas, como a mídia francesa não esconde a cabeça na areia, o debate foi intenso e prolongado.

Obituários e homenagens aqui publicados enfatizam a ousadia, o brilho intelectual, o inconformismo e a capacidade de Bourdieu de dirigir seu olhar aos mais diferentes campos da vida social. Raros foram os que se detiveram naquele que é o campo essencial da fenomenologia social contemporânea – o campo jornalístico. E, como os autores são, em geral, oriundos do campo acadêmico, não devem ter gostado do que disse o mestre a seu respeito: "A influência do campo jornalístico sobre os campos de produção cultural (sobretudo em matéria de filosofia e ciências sociais) se exerce principalmente através da intervenção de produtores culturais situados num lugar incerto entre o campo jornalístico e os campos especializados (literário ou filosófico etc.). Esses "intelectuais-jornalistas", que se servem de seu duplo vínculo para se esquivar das exigências específicas dos dois universos e para introduzir em cada um deles poderes mais ou menos bem adquiridos no outro, estão em condições de exercer dois efeitos principais: de um lado, adotar novas formas de produção cultural, situadas num meio termo mal definido entre esoterismo universitário e o exoterismo (*) jornalístico; de outro, impor, em especial através de seus ensinamentos críticos, princípios de avaliação das produções culturais (...). (Sobre a Televisão, pág. 111)
[(*) Exoterismo: ensinamento que, na Antiguidade grega, era transmitido ao público, sem restrições, dado o amplo interesse que suscitava e a forma acessível em que podia ser exposto. (A.D.)]

Numa excelente entrevista ao Jornal do Brasil (caderno Idéias, 11/9/00), Bourdieu explicou o conformismo dos jornalistas no tocante à própria atividade:
"O jornalismo – que se pensa como um ‘quarto poder’, mas crítico – é sem dúvida um poder que, diante das pressões de todas as ordens que pesam sobre a atividade jornalística (sobre os jornalistas, portanto), já não tem muita coisa de crítico e contribui muito para reforçar as forças mais conservadoras da economia e da política

Mas o que interessa é a sua intervenção – como ela a chama – na TV, foco e título do seu panfleto:
(...) Penso que a televisão, através de diferentes mecanismos (...) expõe a um grande perigo as diferentes esferas da produção cultural, arte, literatura, ciência, filosofia, direito; creio mesmo que, ao contrário do que pensam e dizem com toda a boa-fé os jornalistas mais conscientes de suas responsabilidades, [a TV] expõe a vida política e a democracia a um perigo não menor (...). (Idem, pág. 9)

Essa integridade crítica, essa capacidade de enxergar o conjunto de elementos que compõem o campo jornalístico, incorporando-o ao bojo do processo sócio-cultural, distingue Bourdieu da maioria dos pensadores e críticos contemporâneos.

Hoje, no Brasil, temos críticos que só vêem as mazelas da TV e, como escrevem em jornais ou revistas, fecham os olhos às mazelas específicas destes media. Ou ainda, sendo oriundos da academia, poupam-na de qualquer responsabilidade na difusão do tal "esoterismo universitário".

Pierre Bourdieu viu tudo, não pode ser esquecido.
   


Pierre Bourdieu

       
 

   
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